Em busca de uma identidade coletiva
Assistindo Atlético Mineiro 2X1 Vitória da Bahia pela 23ª rodada do Brasileiro da Série A, mais uma lição ao nosso futebol brasileiro.
Testemunhamos uma linda manifestação em prol do jogo coletivo praticada pelo jovem goleiro, apenas 19 anos de idade, Caíque do Vitória.
No intervalo do jogo, que estava em 1X1, ainda no gramado do Independência, ele se indispôs com o próprio companheiro de equipe, Marinho, que minutos antes havia recusado dar o passe a um companheiro melhor posicionado em favor da sua própria finalização. Não precisa dizer que o atacante do Vitória perdeu o gol em que pese considerar a grande defesa do goleiro atleticano, Giovanni.
A questão levantada pelo goleiro Caíque não estava no perder ou converter o tento. O motivo da revolta do jovem talento rubro-negro aponta falhas recorrentes no futebol brasileiro que trazem prejuízo à qualidade do nosso jogo. O excessivo uso da individualidade tem que cair de moda no futebol brasileiro. Sempre foi marca registrada no sucesso da nossa escola, mas em tempos modernos se transformou em prejuízo e propaganda negativa do jogo brasileiro.
Carlos Rexach, ex-auxiliar do Johan Cruyff no Barcelona, disse certa vez: o jogo dos brasileiros tem mais habilidade, mas demora a andar com a bola em campo. Eu diria que hoje estamos empregando até muita velocidade ao nosso jogo, mas ainda “carregando a bola” bem mais do que devia. O que não deixa de continuar corroborando com as palavras do holandês, pois correr com bola não significa dar velocidade ao jogo.
O passe continua sendo a segunda ou terceira opção do jogador brasileiro que é sempre muito cobrado em exibir sua individualidade.
Voltando aos nossos motivos, Atlético 2X1 Vitória, foi até engraçado assistir pela TV o narrador, o comentarista e a repórter de campo não conseguirem ler o verdadeiro motivo da revolta do Caíque. Pelo menos até depois do jogo com a explicação do próprio Marinho à repórter de campo. Insistiam em achar que o jovem goleiro “apelou” com o seu companheiro pelo simples fato de ter perdido o gol ao tentar encobrir o goleiro atleticano. A discussão para os jornalistas estava na opção ou qualidade do gesto técnico executado pelo atacante.
A questão era muito mais profunda e digna de grandes reflexões. O Marinho tinha um companheiro livre correndo ao seu lado, situação que exigiria uma assistência como a melhor opção para a oportunidade manifesta de gol que se apresentava com a chegada do homem sem bola.
Ao elogiar a postura do Caíque, não pretendo incentivar a violência no futebol. Até porque, acho que a forma expontânea com que o goleiro do Vitória se manifestou é mais fruto da sua pouca idade e justificável por si só.
Quero levantar a bandeira do jogo coletivo, pano de fundo dessa reflexão.
Rogério Micale, pelo menos dois jogos antes da final olímpica, proferia importantes palavras em entrevista coletiva. Disse mais ou menos o seguinte: o peso do ouro olímpico, se vier, não conseguirá apagar paradigmas que travam o progresso do futebol brasileiro. Levantava a necessidade de um mutirão de ações dos vários segmentos do futebol brasileiro em favor da melhoria do nosso jogo.
Concordo plenamente! Precisamos, toda a comunidade futebolística brasileira, rever conceitos!
Nosso jogo está cheio de tomadas de decisões equivocadas, justamente porque acreditamos que as soluções de campo estão dependentes única e exclusivamente da qualidade técnica dos jogadores. Nós, treinadores, também somos mestres em exigir dos jogadores atitudes individualistas na tentativa de “resolver de qualquer jeito”.
Está certo, mas está errado também!
A ênfase do jogo já foi a excelência técnica, mas não é mais. Com os jogadores técnicos e habilidosos que temos, é possível construir jogos coletivos de altíssimo nível. E o mais interessante, sem perder “um centavo” do valor individual e prestigio internacional dos nossos craques!
Importante ressaltar que a atitude do goleiro Caíque tem a ver também com o perfil da formação que recebeu na Base do Vitória. O Clube baiano tem ótimos profissionais de Base e com uma ideia de trabalho bastante avançada. É uma das referências que temos na formação do futebol brasileiro.
Acabo de assistir Manchester United 1X2 Manchester City pela 4ª rodada da Premier League e vi o time do Guardiola abusar do jogo de posse de bola e com muita eficiência. A prioridade no jogo das equipes do Guardiola é a valorização do passe com a manutenção da posse de bola. Emerge deste poderoso conceito tático a busca pelo controle do jogo e o desenvolvimento de todas as ações de campo. O futebol de alto nível no mundo vem evoluindo na corona da aplicação deste e de outros importantes conceitos táticos. Não podemos “perder este trem”!!
Caíque! Estamos juntos!!
Marinho! Não contra você, mas em favor do jogo brasileiro!!
Grande abraço…
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